Novos Voos - Take Two

quarta-feira, setembro 29, 2004
Querido Diário - XV

Lá terá que ser, não é? seus cuscos que querem saber a minha vida toda. Queria ver se tivessem binóculos!!
Bem, antes de mais, deixem-me confessar que sou abstémio. Não que tal seja grande qualidade, digo-o porque tem importância no desenrolar do que vos vou contar.

Decidi levar a Elisa a um restaurante brasileiro chamado "Mi deixe trincá sua picanha" que ao serão tem música ao vivo. Verifiquei que as coisas não iam correr bem quando me apercebi que a Elisa, emborcou 3 caipirinhas antes de começarmos a jantar.
Nem imaginam, depois a acompanhar a feijoada e a picanha bebeu mais uma garrafa de vinho verde Alvarinho (senti uma arritmia quando vi o preço). Precisamente na altura em que metia um copo de água à boca, a Elisa descalçou-se e meteu-me o pé pelas calças acima. Espirrei a água pela boca, pelo nariz e fiquei com um mau estar que nem vos conto. O empregado lá limpou tudo, mas com má cara, que a Elisa já tinha ido três vezes à casa de banho compôr a pintura, e por causa das caipirinhas já não ia muito a direito, esbarrou por duas vezes com ele, que deixou cair duas travessas de picanha. E havia clientes a queixarem-se com o cheiro que ela deixava pelo caminho. Bolas, também já era embirração, ela nem cheirava assim tanto.

Mas o grande problema foi quando um baiano começou a tocar viola. Ela levantou-se de imediato e foi direito a ele. Eu, prevendo o desastre iminente ainda tentei impedir, mas não fui a tempo. Ela pediu ao rapaz para tocar uma "palhinha" e desatou a atacar o "Un bel di vedremo", da Madame Buterfly, em ritmo de samba. Fui um sururu monumental, e um tipo que ia a passar com uma caipirinha na mão, apanhou um cagaço tal, que entornou a bebida por cima de mim. Imaginem se eu levava o Armani! Fiquei com um pivete a álcool indecente.
Não vos vou maçar com o que se passou a seguir, mas comparado com aquilo, qualquer filme do Chuck Norris é uma comédia romântica. Cheguei a temer que fôssemos os dois linchados.

Mas, depois de pagar e apresentar desculpas, lá conseguimos sair, a Elisa não percebia o que se passava, coitada, não tem muito a noção da potência da voz que tem. Meti-a no carro e lá fomos para casa, muito mais cêdo do que previra. O pior foi para ela subir a escada. Ela bem tentava, mas as caipirinhas misturadas com o Alvarinho, não a deixavam subir. E eu atrás a servir de alavanca.A certa altura, quando ela descaiu dois degraus, fiz um esforço tão grande a empurrá-la, que desloquei uma omoplata. E foram umas dores do caraças, só vos digo. Mas como eu me queria era ver-me livre daquilo o mais depressa possível, (sim, que da maneira que ela estava, se tentasse mais alguma coisa, ainda me adormecia a meio), até parece que na altura nem senti a dor. Chegámos ao 3º andar, encostei-a à parede e procurei-lhe as chaves na mala, porque ela já estava meio adormecida. Meti-as na fechadura, mas aquilo não havia meio de abrir. Para abreviar, quando consegui e entrei na casa dela, senti uma pancada na cabeça, e não me lembro de mais nada.

Só no outro dia, no hospital, a Elisa, que estava com uma cara muito envergonhada à minha cabeceira quando acordei, me contou. A sacana da tia dela, quando ouviu o reboliço nas escadas, pensou que eram ladrões que sabiam que ela estava sózinha e a iam assaltar. Vai daí, quando entrei, deu-me com o martelo dos bifes na cabeça e foi essa a causa do meu desmaio. Quando viu o que tinha feito, lá chamou uma ambulância que me levou para o hospital. Ainda levei 5 pontos!
Entretanto a Elisa, tinha-me levado uma caixa de Mon-Chéries, não sei onde ela arranjou aquilo porque não os vendem no Verão, mas na altura nem quis saber, que aquilo é um vício e eu estava cheio de fome. Comi 8 de seguida. Não fiquei foi com um cheiro muito católico. E entretanto chegou o médico que me deitou uns olhos, que vou-vos contar:
- Você ontem chegou cá com uma grossura de todo o tamanho, todo amolgado, e tem a pouca vergonha de já estar borracho outra vez? E chamou a enfermeira para saber quem me tinha "passado" a bebida logo de manhã.
Pois, o tipo, por causa do cheiro da caipirinha que me tinham deixado cair em cima, pensava que as mazelas eram devidas a quedas que eu teria dado, sob os efeitos da bebida. A questão dos Mon-Chéries é que foi mais delicada de explicar.
Bem, o médico lá me deu alta, mas passou-me logo a receita para 12 sessões de fisioteraia por causa da omoplata, e recomendou-me moderação na bebida. E assim fui eu para casa, num estado muito jeitoso e com fama de piancho.

A Elisa foi muito simpática, mas eu durante uns tempos, quero é distância, que a tipa é como uma praga tão grande como o escaravelho da batata ou a peste suína africana. Cada vez que estou com ela, acontece-me alguma. Pode nem ser culpa dela, mas acho mesmo que me dá azar e eu nem sou supersticioso!
Portanto, disse-lhe que era melhor estarmos afastados uns dias, e dei-lhe como desculpa o que a tia me tinha feito. Ela não queria, chamou-me nomes fôfos, mas lá acabou por aceitar, de lágrimas nos olhos quando lhe perguntei se me queria ver estropiado de vez. Acho que esta breve separação só nos vai fazer bem. Tenho os binóculos, para a ir vendo de longe nos seus exercícios de gorjeio em fio dental e wonderbra.

*****


Mas não sou só eu que ando de baixa. Ontem, vi o Simões de muletas e já tinha visto a Etelvina com os olhos todos negros e com os dois braços engessados. Fiquei admirado, já não via o Simões desde o episódio da Ralph Lauren falsificada, mas como passou na brasa, nem tive tempo para lhe perguntar o que lhe tinha acontecido. Nunca tinha visto um gajo de muletas a andar tão depressa.
Mas tive logo a resposta. O Leonardo que levou o barrete da Ralph e marido da Etelvina, estava ao pé de mim e disse:
- Já viste o Simões?
- Já. Anda de muletas.
- Pois. Fui eu que lhe dei um enxerto, a ele e á vaca da Etelvina. Na 6ª feira estava muito cansado, de maneiras que fui mais cêdo para casa e fiquei admirado por a Etelvina estar vestida com o baby-doll cor de rosa que ela só usa em dias de festa, e deitada na cama, assim como quem quer festa, percebes? Mas eu não estava para ali virado, e deixei-me cair na cama vestido e tudo. Mas a cama está velha e como sabes, peso 120 kg. De maneiras que aquilo partiu-se e lá de baixo veio uma voz : AI!! E vai daí eu perguntei: Que é isto??? Quem está aí? e a voz respondeu-me: É o penico!!. Vê lá, era o sacana do Simões a ver se me emdrobinava outra vez. Julgava que eu me esquecia que nós lá em casa já não pomos o penico debaixo da cama há mais de seis meses.

*****


Aqui há uns tempos, ainda morava na casa antiga, contei-vos das preocupações da Clotilde, que é minha vizinha, lembram-se? Eu recordo-vos. Encontrei-a no Largo do Rato e que se vinha com umas grandes olheiras e ar muito apreensivo
- Então? Que se passa? Pareces preocupada.
- Nem me fales! Acho que o Renato arranjou uma gaija! (O Renato é o marido da Clotilde e são meus amigos há anos)
- O quê? Mas que disparate é esse?
- Acho mesmo. Comecei a desconfiar há uns tempos. Ele que foi sempre de cumprir horários, começou de repente a fazer muita hora extraordinária, mas nem se reflectiam no ordenado, nem nada. Dizia que era obrigado, que é a pressão. Mas desconfiei mais, quando começou a faltar a certas coisas. Percebes, não percebes?
- Pois! E então?
- Então, ontem como me disse que fazia extras, fui para uma esquina ao pé do emprego dele, e à hora da saída saíu mesmo! Fui atrás dele sem ser notada, e encontrou-se com uma gaija e foram os dois para uma pensão ali no Arco do Cego. Fui atrás e consegui subornar a dona da pensão com duas notas de 20€, a troco das quais me disse que quarto tinham alugado. Ainda bem que a pensão era de 4ª categoria, porque tinha daquelas fechaduras antigas e eu pude espreitar tudo. Vê lá, os gaijos começaram a despir-se, ela foi mais rápida, e ele às tantas tirou aquele cuecão dele (A propósito, não percebo como vocês conseguem usar boxers, ficarem com aquilo tudo ao pendurão, o Renato diz que os slips lhe apertam demasiado a fruta). Mas como ia dizendo, ele tirou as boxers, e atirou-as pelo ar como costuma fazer em casa. Queres acreditar no azar? Não é que a porra das cuecas ficaram penduradas na maçaneta da porta e não me deixaram ver mais nada?
- E então?
- Então? Então? Agora aqui ando eu nesta incerteza!

Pois já há novidade sobre o assunto. Mas isso fica para a próxima vez.

Escrito por: VdeAlmeida, em 9/29/2004 10:20:00 da tarde | Permalink | | ( 0)Comentários
terça-feira, setembro 28, 2004
Fama e Anonimato

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Disse uma vez Warhol que cada um de nós teria direito aos seus "15 minutos de fama". Claro que a frase peca por exagerada, mas Warhol nunca teve grandes pretensões em ser rigoroso.
Sabe-se, muitos de nós nascem anónimos e assim morrerão, não excedendo a sua fama, o limite estabelecido pelos laços de família (alguns nascem e morrem mesmo sem isso) e pelas amizades construídas.
Porém, não sendo exacta a frase, dela subjaz a ideia de que quem não conseguir esses 15 minutos, será um enjeitado da sorte.
E é sobre isso que me interrogo, face ao estado actual do mundo. Porque de há uns tempos para cá tenho para mim a ideia de que o pior que nos pode acontecer, é ser famosos.

Claro que não falo nos frequentadores habituais das revistas cor-de-rosa.
Não, falo de outra coisa:
Há uns tempos, um intelectual texano, aconselhado por uma destrambelhada e por um admirador secreto dos métodos da Gestapo - ou será Guantanamo muito diferente de um campo de concentração?-, decidiu que estava na hora de o seu país, "a maior democracia do mundo", deixar de estar dependente de outras vontades que não a sua, para ter à sua disposição as maiores reservas petrolíferas do planeta. E assim, acolitado por um travesti inglês-sim, que cada vez mais me convenço que o Blair não passa da Tatcher depois de submetida a uma intervenção de mudança de sexo- a fazer lembrar o cãozinho do His Master's Voice, e por um político espanhol de 4ª categoria a querer põr-se em bicos de pés para ter lugar na História, mas de quem já ninguém se lembra do nome, lançou-se nas 2ªs Cruzadas da História, esquecendo-se das infames marcas deixadas pelas 1ªs. Mas claro, também seria exagerado pretender-se que o brilhante texano conhecesse a História Mundial, que está para trás do séc.XX, e que exceda os limites do seu país.
Ah! pelo meio do atabalhoado do discurso, omiti a presença de um ilustre rapaz de sangue transmontano - pobres transmontanos, companheiros dos açoreanos no opróbio - que os recebeu na divisão mais longínqua da sua casa, e lhes serviu de mordomo naquela que seria a reunião da desvergonha.

Veja-se pois quem, vítima das decisões então, tão democraticamente tomadas, tem nos últimos dias ganho direito aos seus 15 minutos de fama em televisões, jornais e revistas:
- Uma quantidade considerável de americanos decapitados, lista que vai crescendo todos os dias.
- Dois jornalistas franceses, assassinados da mesma forma.
- Duas cooperantes italianas de quem ninguém sabe o paradeiro, mas que o mais certo é virem a integrar a tal lista.
- Um inglês que todos os dias sofre a agonia de não saber se aquele vai ser o primeiro dia do resto da sua vida, ou o último.

Estes são só exemplos, grãos na engrenagem que por ela vão sendo, inexoravelmente, esmagados.Já houve italianos, australianos, mais ingleses, turcos, todos imolados no fogo ateado pelo génio texano, um ser de tal gabarito que lhe poderia ser assacada a célebre frase: "O mundo estava à beira do abismo, comigo deu um passo em frente", se já não houvesse quem antes lhe reivindicasse a autoria.

É assim, portanto, um mundo estranho, este onde vivemos, onde se adquire uma fama que não se procura, nem se deseja. Por mim, espero continuar anónimo até ao fim. Oxalá continue a ser conhecido só na minha rua, afastado de cabeçalhos de jornais ou aberturas de Telejornais. Mesmo até ao fim.

Adenda - Soube agora pela Sic-Notícias que as duas italianas terão sido libertadas. Se assim foi, congratulo-me com o facto, e a notícia já fez o meu dia valer a pena.

P.S.- Claro que poderia aqui também falar daqueles dois seres que executaram sumariamente uma criança no Algarve. São talvez, por estes dias, os indivíduos mais famosos e mais citados no País.
Como se verifica, também pelos melhores motivos.
Aliás, a propósito deste triste episódio, tenho achado curiosa esta forma de alguns abordarem o caso que é o acrescentarem "E só por 12 euros". Como se isso pudesse sequer fazer parte da argumentação condenatória.
Não, importante é que a criança foi assassinada. E monstruoso que o tenha sido por quem a devia proteger. Os 12 euros podiam ser 12.000. A gravidade do caso, seria sempre a mesma.

Escrito por: VdeAlmeida, em 9/28/2004 05:56:00 da tarde | Permalink | | ( 0)Comentários
segunda-feira, setembro 27, 2004
Da minha janela, o Rio

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Hoje, quando te olhei da minha janela, como faço todos os dias logo pela manhã, estavas diferente. Estás sempre diferente, a cada dia, a cada hora, a cada momento mudas, mas és sempre o meu Tejo, o rio com que cresci.

Todos os dias me beijas longamente os olhos,
Rio meu, que me corres em todos os sentidos

****

Esta névoa sobre a cidade, o rio,
as gaivotas doutros dias, barcos, gente
apressada ou com o tempo todo para perder,
esta névoa onde comeca a luz de Lisboa,
rosa e limão sobre o Tejo, esta luz de água,
nada mais quero de degrau em degrau
.
(Eugénio de Andrade)

****

"E aqui estou eu,
ausente diante desta mesa-
e ali fora o Tejo.
Entrei sem lhe dar um só olhar.
Passei e não me lembrei de voltar a cabeça,
e saudá-lo deste canto da praça:
"Olá, Tejo! Aqui estou eu outra vez!"
Não, não olhei.
Só depois que a sombra de Álvaro de Campos se sentou a meu lado
me lembrei que estavas aí, Tejo
"
(Adolfo Casais Monteiro)

Escrito por: VdeAlmeida, em 9/27/2004 10:31:00 da manhã | Permalink | | ( 0)Comentários
sexta-feira, setembro 24, 2004
Querido Diário - XIV

Nem sei por onde começar, mas se calhar é melhor deixar a parte do jantar para o fim, porque tenho que apanhar embalagem.
O Aníbal trouxe-me uma novidade da sua viagem a Espanha. Mostrou-me uma fotografia que se deu ao trabalho de tirar em Espanha. Foi a um sinal de trânsito, e eu já o conhecia, mas estranhei que lhe tivesse dado para fotografar o sinal

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- Passámos por ele, e até pedi ao motorista para parar, se passássemos por outro igual porque queria fotografar.
- Mas porquê? Isto é o sinal de que há um pequeno desvio na estrada para os condutores puderem descansar, nas longas viagens.
- Isso cá não sei. Sei é que eles copiaram isso. Esses gajos dos espanhóis copiam tudo por nós.
- Como?
- Sim, nós tínhamos lá um igual na repartição, que o nosso chefe arranjou. Foi assim, nós íamos para a casa de banho ler "A Bola" à vez, e passávamos a manhã aquilo, ia um, ia outro, muitas vezes, 3 ao mesmo tempo e ele disse que aquilo não podía ser, que era uma balda e que sabia o que eram as nossas idas à casa de banho, e que ia estabelecer uma hora de "cófibreique". E então arranjou esse sinal, que às 10 da manhã metia em cima da secretária, e tirava às 11 e meia. E disse que aquele era o sinal da "Hora de arrear a calça e ler o jornal". E já viste que é o que o boneco do sinal está a fazer? Tá ou não está a arrear a calça e a ler o jornal?

Bem, estas descobertas do Aníbal estão para além da minha compreensão.

Mas agora ando com receio que o futuro dele não seja lá dessas coisas. O Venâncio disse-me ontem que decidira pôr na montra uma lista com os calotes do café 33. E mostrou-me: a Amélia por exemplo, deve 82,20€ referentes a 64 queques, 64 cafés e 33 brigadeiros. E a lista segue com todos os detalhes e bem comprida. Acho que é um disparate, porque pelo que vi, muito poucos frequentadores não constam da lista, pelo que o Venâncio, por motivos tão irrisórios, sujeita-se a ficar com o café às moscas. Mas o que achei mesmo estranho foi um calote que o Anibal lá tem que dizia:
180€ - "moedas para a máquina". Perguntei-lhe que era aquilo e ele disse que eram moedas que o outro lhe pedia para meter na máquina de preservativos que um vendedor o convenceu a meter no café.
Eu disse-lhe:
- Mas isso é muito preservativo!
- Pois é, dois por dia, mas nunca tinha dinheiro trocado para a máquina. E o Aníbal era o único freguês, aquilo foi um barrete que apanhei, só me deu prejuízo. Foi da altura em que andou em cavalarias com a padeira.Ele é que praticava e eu é que pagava o material desportivo!
- Mas se você lá mete isso, a Amélia dá cabo dele!
- Ná! Ela já sabia. Foi na altura em que ela andava enrolada com o Simões, de modo
que lhe convinha fazer vista grossa.
Por esta não esperava eu! Ah! grande Simões. Não só petiscava em casa do Leonardo na sua ausência, como ainda fazia umas surtidas a casa do Aníbal. Por isso é que cada vez que o apanhava no café fazia questão de lhe pagar o café e o bagaço!
Agora por isso, o Simões continua desaparecido

O Vidal apareceu ontem com a cabeça toda entrapada, parecia um queijo da serra.
- Bom dia, sr. Vidal. Teve algum acidente
- Foi um acidente doméstico, na noite passada. Escorreguei e bati com a cabeça na mesa de cabeceira.
Arranjei uma desculpa, desejei-lhe as melhoras e virei-lhe as costas que me estava a dar uma grande vontade de rir, mas ao mesmo tempo todo lixado. Logo nessa noite que eu não tinha usado os binóculos é que o gajo errara o salto de maneira espectacular.
Bem dizia a Elvira, que é a vizinha dele do rés do chão que achava que por volta da uma da manhã, já estava deitada há um bocado e sentira um violento tremor de terra e ficou muito admirada por ninguém mais ter dado por isso. E claro, o Vidal na altura não se descoseu.

Já vi que não me safo do jantar.
Devo dizer que as surpresas começaram mal cheguei para buscar a Elisa. Levei um pequeno ramo de rosas para a tia, e para ela um raminho de violetas que é a minha flor favorita, juntamente com o amor-perfeito. Acho que ela estava à espera de orquídeas porque disse que as violetas tinham um cheiro muito activo. Grande lata,
para quem usava Poison!
Bem, mas quando a vi até sustive a respiração durante alguns 3 minutos. Trazia um vestido de seda preta muito justo, acho que era para aí uns 2 números abaixo do aconselhável, e com um decote até ao umbigo, debruado com uns folhos vermelhos.
Olhei-a e não consegui perceber como aquilo tudo estava tão em cima, porque não lhe vislumbrava sequer sombra de wonderbra. Enfim, aquilo era tudo muito redondo, muita curva e contra-curva, ainda por cima, empinada nuns sapatos da mesma cor com salto agulha para aí de 15 cm. Nunca tinha visto uma tal concentração de armas ofensivas.
Aquilo era pior que um arsenal!
Depois, a pintura era a condizer, uma mistura de japonesa com comanche preparada para executar a dança da chuva. Embora achasse exagerada a pintura dos olhos, aqueles beiços pintados de vermelhão a dar com os folhos, eram um pecado e até parecia que tinham iman (só o perfume me mantinha à distância). Quando descemos as escadas, eu ia à frente, só ia à rasca com medo que ele se pudesse desiquilibrar dos altos, e me cair em cima. E felizmente que não aproveitou para fazer nenhum avanço, porque naquela escada tão estreita, teria sido trágico, mesmo mortal.
Desta não trazia Poison, embora fosse um perfume do género, acho que era o Tendre Poison, o que na prática vinha a dar no mesmo. E mal cheguei ao carro, abri as janelas todas. Ela disse que estava fresco, mas lá a convenci que estava uma bela noite de verão e que tinha o ar condicionado avariado (mentira, claro). De qualquer maneira, não me livro de ter que mandar lavar o carro por dentro, que agora toda a gente se recusa a lá entrar.

A viagem correu razoavelmente, só falhei uma meia dúzia de vezes a 4ª (fugia-me sempre a mão para a marcha atrás, que fica mesmo ao lado), mas isso parece que já é sina, quando a Elisa me entra no carro.

Bem, e acho que o jantar propriamente dito, fica para a próxima ou assim, porque olhei agora para o relógio e está na hora da fisioterapia.

Escrito por: VdeAlmeida, em 9/24/2004 04:01:00 da tarde | Permalink | | ( 0)Comentários
quinta-feira, setembro 23, 2004
Fogueiras

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Na fogueira que ateaste
metes achas
Quando as tuas mãos de seda
a ti me chamam
E eu me deixo
voluntário abandonar
Aos desejos que me impões
mais caprichosos
Corre então solta
a paixão pelos lençóis
Desprendem-se odores,
frémitos, sabores.
No azul da noite,
somos filme numa tela,
E explodimos
em míriades de estrelas
com a energia inesgotável
de mil sóis
Mas ao amanhecer
sais nua e bela
Deixando-me só
e sem remorso.

E assim, entre inferno e paraíso
Vai o fogo consumindo
os nossos corpos
Que se imolam
em altares voluptuosos

Escrito por: VdeAlmeida, em 9/23/2004 01:58:00 da tarde | Permalink | | ( 0)Comentários
segunda-feira, setembro 20, 2004
Os moinhos já não existem

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Agarro-lhe a mão com suavidade, pareço recear magoar-lha, tão pequena me parece na minha. Tem, como habitualmente, a face afogueada e um pingo de transpiração humedece-lhe os cabelos alourados cortados curtos. Os olhos, esses são sempre inquisidores. Como brasas. Perguntam-me muito em silêncio. Por vezes, dá-lhes voz.
Respondo-lhe como posso, quando posso. E são tantas as vezes que emudeço, pesaroso por não poder ser assertivo.

"Pareceu-me totalmente inconcebível que alguém fosse confrontado com uma tal imponência e não ficasse esmagado pela sua beleza; contudo, segundo Keneth ClarcK quase nenhum visitante dos Alpes anterior ao séc.XVIII chamou a atenção para a paisagem. Actualmente, como é óbvio, o problema é inverso. 50 milhões de turistas atropelam-se anualmente pelos Alpes, maravilhando-se e espoliando simultâneamente a suabeleza. Toda a construção associada a estâncias turìsticas, hotéis, lojas, restaurantes, casas de férias, pistas de ski, teleféricos e novas auto-estradas não só está a alterar irremediavelmente a face dos Alpes como também a minar as suas fundações. Em 1987, a apenas alguns quilómetros para leste do lugar onde eu agora passava, morreram 70 pessoas quando uma inundação súbita avançou sobre o vale Valtellina, varrendo casas e hotéis, como se fossem caixas de fósforos à frente de uma vassoura. No mesmo Verão morreram 30 pessoas numa avalancha em Annecy, na França. Se as encostas das montanhas não tivessem sido despojadas de árvores para novos alojamentos e estâncias, nenhuma daquelas catástrofes teria tido lugar".
Bill Bryson, in "Nem Aqui, Nem Ali".

Amiúde, sinto uma satisfação sofrível por ainda não se aperceber da imensidão de pequenos infernos que vão ardendo à sua volta e por as suas dúvidas se resumirem ainda às coisas mais simples. Mas sei que as perguntas, com a idade, se irão tornando cada vez mais embaraçantes. E as respostas, ainda mais difíceis.

"Os moinhos já não existem, mas o vento continua a ser o mesmo" Vincent Van Gogh em carta a seu irmão Theo

"Os nazis marcavam com números a pele dos judeus, hoje, os judeus marcam com números a pele dos palestinianos, e embora um oficial do exército de Israel afirme que "estes números se podem apagar", estamos a assistir à mesma preversão, e as nações, sobretudo a Europa, contemplam isso, com a mesma passividade com que outrora foi permitido o holocausto".
Luis Sepúlveda, in "Uma História Suja"

Pior que tudo, é que, quando ele tomar consciência da realidade em toda a sua amplitude, sei que me vou sentir inapelavelmente envergonhado por fazer parte destas gerações agora adultas, mas inertes, silentes e comodistas, que continuam a deixar na mão de uns quantos burocratas inescrupulosos e em muitos casos corruptos e traficantes, a decisão de um futuro que devia ser moldado pelas nossas mãos.
Sim, temo a chegada do dia em que ele me perguntará:

Mas afinal, que mundo me deixas tu?

Arte fotográfica daqui

Escrito por: VdeAlmeida, em 9/20/2004 08:25:00 da tarde | Permalink | | ( 0)Comentários
sexta-feira, setembro 17, 2004
Querido Diário - XIII

Ando a preparar-me psicologicamente para o jantar do próximo domingo com a minha valquíria. Só espero que não deixe as cicatrizes do outro. Para já, tomei várias decisões:
1º não vai ser no "Au tête de vache", até porque o Aristides já me avisou que comprou uma caçadeira, para o caso da Elisa se lembrar de voltar a abrir a boca perto do estabelecimento dele, e como aquilo dos cartuchos sai sempre o chumbo disperso, já sei que com a minha dose de sorte habitual, quem levava com a maior parte da chumabada era eu. Ela bem queria ir ao La Tavola Toscana, que é do Gomes, que também é meu amigo, mas eu prefiro levá-la a um restaurante onde não seja conhecido, de preferência longe do bairro, ou mesmo noutra cidade, porque não quero correr o risco de perder outra amizade, ou mesmo ser proscrito aqui da zona.
2º Vou ver se fico sentado de lado, porque se fico de frente, não consigo tirar os olhos do decote (ela usa sempre uns decotes enormes, pudera!), e acabo por não comer nada de jeito, e passar a noite cheio de pesadelos, como aquele que tive noutro dia, em que era sufocado por uma meloa gigantesca.
3º Pelo sim, pelo não, vou hoje convidá-la para umas cervejas e uns caracóis no café 33 e vou pedir ao Viegas (que é o dono), para gelar bem os copos, para ver se ela perde a voz temporariamente, ou se, pelo menos a deixa um bocadito rouca, não vá dar-lhe para desta, desatar a assassinar a Aída ou o Nabuco.
4º Vou de jeans, t-shirt coçada e um blusão de ganga, também já muito usado. Assim, se as coisas derem para o torto, vai tudo direito ao lixo, e evito a conta da lavandaria.

A propósito de jeans, o Simões que é um tipo que vive de expedientes (quando lhe perguntam a profissão, responde que é calceteiro marítimo), aqui há tempos começou a vender roupa de marca a preços baixos. De repente, aqui na rua, começou tudo a andar com grandes cenários. Um dia destes em que tive que me levantar com as galinhas, encontro a Amélia a caminho do seu lugar de peixe na Praça da Ribeira, com um vestido de piqué vermelho da Lacoste, um lenço de sêda Versace ao pescoço, malinha Louis Vuitton à tiracolo, e empinada nuns sapatos Prada. Até me belisquei, mas era verdade. Só lhe faltava mesmo ter feito o buço, porque também ia toda bem pintada, mas parecia que estava enfarruscada por cima dos beiços. Depois, aquele cheiro, também nunca a abandona. Acho que nem que estivesse uma semana numa sabonária aquilo desaparecia. Nem sei como é que o Aníbal aguenta.
Ora eu acho que aquilo é tudo contrafacção e nunca lhe comprei nada, a não ser um belo Rolex que parou ao fim de 7 horas completas, impecavelmente certo (já lhe tinha caído o ponteiro dos segundos), mas ele prometeu que mo substituía.
Bom, mas o Simões teve o azar de vender por 15€, um polo azul escuro da Ralph Lauren ao Leonardo, que é a tal "viga" de 2 metros e que não gosta muito de brincadeiras, e garantiu-lhe que aquilo era produto garantido. Ora há uns dias, o Leonardo apareceu muito transtornado à procura do Simões, que por acaso não aparece desde o dia em que fez a venda. Perguntei-lhe o que se passava e ele respondeu:
- Deixa-me lá encontrar o sacana que eu conto-lhe! Vai vender roupa ao corpo clínico do hospital de S. José! Vê lá que o polo que tu viste ele vender-me, eu usei-o 3 dias, sabes que sou asseado e como transpiro muito, nunca uso as camisas mais que 3 dias seguidos, e a seguir dei à minha mulher para lavar. Ela meteu aquilo junto com os lençóis amarelinhos que a minha mãezinha me deu quando me casei, e agora aquilo está tudo tingido de azul. Se a minha mãe os vê, dá-lhe uma coisinha, que eu já sei como ela é sensível com estas coisas.

Realmente, a mãe dele é uma senhora muito sensível e respeitável. Ainda há uns tempos, no café 33, lhe deu um chapadão por ele estar a coçar as partes íntimas em público. Foi bonito ver-se aquele matulão ficar vermelho que nem um tomate e com lágrimas nos olhos.
- Mas não sabes o pior. O emblema da Rof Lóren descolou-se, tás a ver? Aquilo não era Rof Lóren. O gajo enfiou-me o barrete.

Bem, o Leonardo estava mesmo fulo. Imagino como será quando descobrir que o Simões, á sorrelfa, também faz umas visitas à Etelvina (que é a mulher do Leonardo), quando ele vai fazer "segurança" para fora de Lisboa, e que em geral, essas visitas demoram a noite toda.

Ontem, o Aníbal teve mais uma das suas brilhantes tiradas. Sem sequer me cumprimentar atirou-me:
- Ainda há profissões boas, que nos fazem felizes. Cada vez me arrependo mais de não ter passado da 4ª classe.
- Então? A que se deve esse tardio arrependimento?
- Gostava de ser ginecologista, como o sr. Dr. Guilherme. Tenho a certeza que ia ser felicissimo. Como ele.
Bem, aqui, e sabendo das peculiaridades da personalidade do Aníbal, comecei a, de certo modo entender. E até tive alguma relutãncia em fazer a pergunta seguinte, mas não percebia aquela da felicidade:
- Mas porque dizes isso? Como sabes qur ele é feliz?
- Ora, tu és cego? Não vês que o homem anda sempre, mas sempre, com um sorriso de orelha a orelha?
Até fiquei zonzo. Mas lá recuperei e disse-lhe:
- Aníbal, o homem tem uma paralisia facial permanente que lhe tolhe os músculos do rosto e o obriga a ter a cara assim. Mesmo sem ele querer.
- Ora, tá bem, tá bem! havia eu de ser ginecologista que bem precisava de uma paralisia facial para andar feliz o dia inteiro!

Na verdade, continua-me a ser muito difícil argumentar com o Aníbal.

Ah! Já me esquecia, comprei uns binóculos novos com um raio de acção extraordinário. São daqueles que são usados pelos Marines americanos e acho que aquilo é tão potente, que até através das paredes se consegue ver. Mas nem precisou de ser através das paredes, foi mesmo pela janela que eu vi as acrobacias do Vidal e da mulher, que moram aqui no 2º andar de um prédio um pouco mais acima. Nunca tinha visto ninguém atirar-se todo nú de cima do guarda-fato para a cama sem partir nada. Nem a cama.

Mas isso é outra história.

Escrito por: VdeAlmeida, em 9/17/2004 06:18:00 da tarde | Permalink | | ( 0)Comentários
quinta-feira, setembro 16, 2004
Luzes

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Não sei se algum dia
vou vencer
este medo que me tolhe
o pensamento
de poder deixar
de sentir a emoção
que de mim toma conta
quando vejo
um riso desenhado
de esperança
numa cara pura e bela
da criança.

Ou perder a vontade
de sonhar
de deixar escapar
por entre os dedos,
a capacidade
de com tudo me espantar.

Só sei que há luzes
que perduram nos meus olhos
De pequenos gestos
e sorrisos que em mim
deixaram rasto
E são essas
que não me deixam desistir
De, àquela mão
que se me estende
Corresponder, dar a minha
E dizer sim

Escrito por: VdeAlmeida, em 9/16/2004 06:37:00 da tarde | Permalink | | ( 0)Comentários
Voos por outras terras

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Aí está um dos sítios por onde cirandei nestes dias em que respiraram aliviados com a minha ausência!
Outros houve, igualmente agradáveis, e estou a pensar em fazer uma espécie de reportagem fotográfica seguindo o meu vôo.
Entretanto, enjoy the puppy.

Vic

Escrito por: VdeAlmeida, em 9/16/2004 04:04:00 da tarde | Permalink | | ( 0)Comentários
segunda-feira, setembro 13, 2004
Querido Diário - XII

A tia da Elisa, a Dona Ermelinda é uma simpatia. Quando estive retido em casa devido aos traumatismos resultantes do nosso jantar, fez questão de me visitar e até me levou um botão de rosa vermelho e um embrulhinho com dois pastéis de nata. Gabou-me o cavalheirismo, os cortinados da cozinha e a decoração da sala, e até me vieram duas lágrimas aos olhos. E claro, exaltou-se quando falou do "embrulho" do 2º esqº e respectiva família, que juntamente com a velhota surda do 2º direito lhe estão a dificultar a evolução musical da sobrinha, que segundo ela tem um futuro brilhante à sua frente. Sinceramente, gosto muito da Elisa, mas não consigo partilhar aquele optimismo da velhota. Por outras palavras, gosto do feitio do instrumento, mas muito pouco do som que emite.
Mas a ida da tia da Elisa, não foi uma mera visita de cortesia. Foi meter uma cunha para eu assinar uma petição que anda a correr, para permitir a continuação das aulas da Elisa. Só que também anda a correr outra em que ela é considerada perigosa para a sanidade mental da vizinhança. E agora estou na incerteza sobre qual das duas assinar, mas o mais certo é assinar as duas, desde que as listagens não sejam
divulgadas. Tenho que me informar bem sobre esse pormenor. Ah! e claro que também veio insistir comigo para aceitar o convite para novo jantar a dois. Que vou ser eu a pagar, claro!

O Albano já voltou a falar comigo.A Josefa desentendeu-se com o responsável pelo núcleo das Testemunhas e acabou por aderir aos Manás. Portanto, nada justificava a permanência dele por aquelas bandas, pelo que voltou a ser o Albano dos velhos tempos. E com as histórias de sempre. A última foi ter ido numa viagem a Mérida. Ele recebeu um prospecto na caixa de correio em que se anunciava uma viagem em "AutoPluma" (sic) daqui a Mérida, saída às 7 da manhã com passagem por Évora e visita á zona histórica, passagem por Badajoz com almoço típico e tarde livre para compras, e jantar já em Mérida com pernoita em hotel de 2 estrelas e volta no dia seguinte de manhãzinha. A organização dava ainda um jogo de panelas, um serviço de jantar e um presunto de porco preto. Tudo isto por somente 30€ por pessoa.
Bem, aquilo realmente era muita fartura para o Albano resistir, de modo que lá convenceu a Amélia e aí vão eles. E esta manhã, lá esteve a contar-me a história. Estava exultante e só me dizia que tinha feito um grande negócio.
Foi assim: a organização levava um animador e pela amostra a viagem decorreu sobre o signo da anedota de mau gosto e a música ainda pior.
Diz-me o Aníbal:
- Conheces a do tipo que tinha três pernas?
- Não. Mas pelo que já contaste até agora, já vi que não me vai interessar conhecer. Olha lá, mas aquilo foi só essas foleirices?
- Não. Também teve uma parte cultural muito importante. Évora é uma cidade espectacular.
- Isso eu sei. É das coisas mais bonitas que conheço. E cheia de história.
- E alguma vez foste à Capela dos Ossos?
- Claro, respondi. Já me estava a admirar com a elevação da conversa.
- E viste lá os dois esqueletos do D. Afonso Henriques?
- Dois?????!!!!!!
- Sim, dois. Um dele quando era criança, e outro da altura em que morreu. Foi o nosso cicerone que nos contou.
Fiquei siderado com aquela demonstração de cultura, e nem quis fazer comentários. Até porque ele não me deixou e continuou:
- Depois em Mérida, foi um serão a fazer negócio. Comprei 11 edredons verdes (um foi de borla) por 120€, um jogo de malas em pele sintética por 100€, e um maple de napa vermelha por 150€. Gandas negócios, como vês.
Bem, estava visto porque é que os tipos organizavam aqueles passeios!
Nem me atrevi a perguntar-lhe para que queria ele 11 edredons verdes.
E ele acrescentou:
- Os tipos são uns bacanos. Além de tudo o que nos ofereceram (sim que além do jogo de panelas, do serviço de jantar e do presunto, os 30€ nem para pagar a feijoada do almoço e a jardineira da noite chegavam), ainda nos ofereceram um porta chaves da empresa, uma cotonete em metal(?) e um saca-rolhas que aqui trago para veres a pinta dele.
E tirou-o da algibeira. Ia caindo para o lado, com a emoção. Era uma réplica do Mannecken Piss. Pois é, vocês já devem estar a ver qual era a parte da anatomia do Mannecken que serve para sacar as rolhas! Aquilo era monstruoso, mas ele exibia-o orgulhoso e com um sorriso de orelha a orelha.
Decididamente, não entendo aqueles gostos do Albano. E já percebi porque é que ele ultimamente anda a ouvir mal.

O Hernâni, que mora no 1º andar do prédio da Elisa, por baixo da velhota surda, comprou um Mercedes verde alface de 1970. Estava todo satisfeito a poli-lo quando eu passei. Perguntei-lhe se agora se dedicava a antiguidades. Ele olhou para mim e disse:
- Tás a gozar? Isto é uma bomba. Está tão impecável de motor como de chapa.
Enquanto o escutava, encostei-me ligeiramente ao guarda-lamas dianteiro do lado direito, que caiu como se estivesse maduro, e me ia decepando o dedo grande do pé, o que me costuma doer quando o ácido úrico sobe. Um mártir, este dedo. Ainda exijo que seja canonizado. O enfermeiro do posto, quando me viu entrar, exclamou com ar sarcástico:
- Tava a ver que hoje não aparecia. Já estava a estranhar que o meu mais assíduo freguês não me aparecesse cá hoje. Realmente, com curativos, mudanças de penso, etc., acho que há quase três semanas não falhava lá um dia. Mas não aprecio o humor do homem. Aliás, desde que me deu uma injecção contra o tétano quando eu estava distraído, ainda sentado na marquesa, a olhar para a funcionária do atendimento do
posto, que por acaso é mulher dele e que estava a ler uma revista debruçada de tal maneira que os peitos quase lhe saltavam pelo decote, que o homem não é santo da minha devoção. Andei quase uma semana sem me poder sentar sobre aquele lado.

Ah! E o Hernâni ainda queria que lhe pagasse o arranjo do chaço. Ganda lata!

Escrito por: VdeAlmeida, em 9/13/2004 07:25:00 da tarde | Permalink | | ( 0)Comentários
I'm back for good!

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Da minha janela, vejo o mundo passar.
Mas por vezes sinto a necessidades de passear eu por ele.
Aos que apareceram e me deixaram mensagens amigas, o meu agradecimento, e a certeza que a todos responderei.
Mais logo.
Até já, amigos

Vic

Escrito por: VdeAlmeida, em 9/13/2004 02:49:00 da tarde | Permalink | | ( 0)Comentários
sábado, setembro 04, 2004
Querido Diário - XI

Nem sei como começar a contar-vos o que se passou então na semi-escuridão das escadas da Elisa. Como disse, quando ela me puxou para dentro fê-lo com tal frenesim que quase caí no primeiro degrau. Ainda não me tinha recomposto e já ela arremetia. Saltou-me ao pescoço e quase mo partiu, que eu senti um estalo sêco. Depois, puxou-me a cabeça para ela. Nessa altura, voaram os dois botões do vestido e o wonderbra 44 surgiu em todo o seu esplendor, derramando contra mim aqueles dois hemisférios sedosos.Claro que nessa altura devia-me sentir no éden. Só que o nariz ficou entalado no estreitíssimo espaço entre as duas cabeças do Dunga e mal conseguia respirar, a dor no pescoço agravava o mal estar, a vista inflamada fazia questão de me lembrar que existia, e assim a situação tornara as escadas em catacumba de tortura de uma ditadura sul-americana. Sentia-me agonizar.
Pior ainda foi quando, alertado pelo reboliço apareceu o solícito vizinho do 2º esquerdo, o tal que é casado com a tipa que se parece com um acidente de automóvel visto de trás. E dei pela presença do sujeito, ao sentir entre as costelas flutuantes o que me pareceu um cano de espingarda, pelo que pus de imediato os braços no ar. Descansei quando me virei ligeiramente e vi que se tratava de uma vassoura. Mas fui-me abaixo quando me apercebi que ele pretendia com ela vingar-se dos agravos anteriores.
Acho que naquele momento, a minha vida toda me passou pela frente num flash e me vi do outro lado túnel. De um lado uma valquíria em ponto de rebuçado, para o que eu pouco tinha contribuído. Do outro, um homem ofendido que pretendia lavar a honra pela ponta da vassoura.
Mas nessa altura a Elisa, fula com o homenzinho que assim a privava do banquete que ela antecipara, desatou a chamar-lhe mastronço e troglodita, ao mesmo tempo que lhe sacava a vassoura das mãos. O que ela lhe disse! Até a masculinidade do sujeito foi posta em causa.
Nessa altura achei por bem aproveitar a confusão, porque ao duo já se tinha juntado a mulher do tipo, mais o bufo do filho e a tia da Elisa, e saí, escorregando suavemente por entre as roliças pernas da minha passarinha (já repararam que eu nunca falei dos vizinhos do r/c e do 1º, que desta também primaram pela ausência?). Cheio de mazelas, com o Armani a parecer um fatinho comprado na Rua dos Fanqueiros, mas sobrevivente, respirei quase aliviado quando o ar da rua me atingiu em cheio. Foi assim que subi as escadas de casa. E como o Armani já não se safava sem uma limpeza - vá lá que não apresentava danos maiores , deixei-me cair na cama e de tão cansado adormeci sem precisar de Xanax, ainda com os ecos da discussão que me vinham do outro lado da rua na cabeça. Foi uma noite de horror. E de vergonha.

Na manhã seguinte tive que chamar o meu amigo Renato pelo telefone, para me ajudar a ir até ao posto de enfermagem porque não me conseguia desenrascar sózinho.
O Renato é um bom amigo, embora tenha uns hábitos peculiares. Ele mora num pátio da rua de baixo com a mãe, que tem um lugar de fruta na praça da Ribeira e também vende galinha caseira ali na vizinhança. Há uns tempos encontrei-o a sair de uma escada que nem sequer era da casa dele. Trazia uma galinha debraçada. Achei aquilo bizarro, ri-me e disse-lhe
- Olá, Renato. Então? vais comer a galinha?
- Não, já a comi. Agora vou-a pôr outra vez no galinheiro, não vá a minha mãe dar-lhe pela falta.
Confesso que fiquei de boca aberta e sem poder de reacção durante vários minutos, além de que andei uns meses sem conseguir comer galinha, frango ou outro qualquer animal de penas.

Mas lá fui com o Renato, que me ajudou a vestir uma camisa lavada e o casaco - ainda não recuperei nele a confiança suficiente para o permitir ajudar no vestir das calças - além de que o que mais me custava a mexer era o pescoço.
Quando saí do posto, vinha numa figura estranha. tanto que quando me vi ao espelho ia caindo: com um penso na vista e uma coleira ortopédica, nem me reconheci.
E o estúpido do Renato começou a chamar-me Luís Vaz!

Só me suavizou as dores o bilhetinho da minha canária a desejar-me as melhoras e a convidar-me para novo jantar na próxima semana, mas já a avisei que primeiro tinha que deixar a coleira, depois, que temos que ir a outro restaurante. Além disso obriguei-a a prometer que não cantava à sobremesa, porque, disse-lhe eu, uma artista daquele calibre não podia desperdiçar o talento em récitas beneméritas e ainda por cima, para non connaisseurs. Não apreciou a palavra, mas eu expliquei-lha.

Andei uma semana naquela figura, portanto já sabem o porquê da minha relutância em vos relatar coisas pouco lisongeiras, ninguém gosta de ir à caça e vir de lá chamuscado pelas cartuchadas de uma caçadeira, e foi assim que me senti. Nem imaginam as vergonhas que tenho passado! Até decidi fazer uma pausa nas minhas idas ao café 33. É que se murmuram muitas coisas à minha passagem e algumas já me chegaram aos ouvidos. Isso, e as novos ensaios da minha Callas que muito têm dado que falar, mas isso fica para a próxima

E agora já me ando a preparar para a próxima e nem pensar em levar o Armani. Vou de jeans e preparado psicologicamente para ser eu a tomar iniciativas.

Escrito por: VdeAlmeida, em 9/04/2004 05:07:00 da tarde | Permalink | | ( 0)Comentários
quinta-feira, setembro 02, 2004
Em laços

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Enlaço-te em abraços
Dou-te laços
Caminho devagar
Vacilo nos meus passos
Recuo e logo avanço
Prendo-te nos braços
Puxo-te para mim
Apago espaços
Fecho os olhos
Mas reconheço os traços
Da tua boca, água
de desejo
E nela, que me espera
solto o beijo
E expludo de prazer
Em mil estilhaços

Escrito por: VdeAlmeida, em 9/02/2004 09:29:00 da manhã | Permalink | | ( 0)Comentários
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