Novos Voos - Take Two

terça-feira, setembro 28, 2004
Fama e Anonimato

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Disse uma vez Warhol que cada um de nós teria direito aos seus "15 minutos de fama". Claro que a frase peca por exagerada, mas Warhol nunca teve grandes pretensões em ser rigoroso.
Sabe-se, muitos de nós nascem anónimos e assim morrerão, não excedendo a sua fama, o limite estabelecido pelos laços de família (alguns nascem e morrem mesmo sem isso) e pelas amizades construídas.
Porém, não sendo exacta a frase, dela subjaz a ideia de que quem não conseguir esses 15 minutos, será um enjeitado da sorte.
E é sobre isso que me interrogo, face ao estado actual do mundo. Porque de há uns tempos para cá tenho para mim a ideia de que o pior que nos pode acontecer, é ser famosos.

Claro que não falo nos frequentadores habituais das revistas cor-de-rosa.
Não, falo de outra coisa:
Há uns tempos, um intelectual texano, aconselhado por uma destrambelhada e por um admirador secreto dos métodos da Gestapo - ou será Guantanamo muito diferente de um campo de concentração?-, decidiu que estava na hora de o seu país, "a maior democracia do mundo", deixar de estar dependente de outras vontades que não a sua, para ter à sua disposição as maiores reservas petrolíferas do planeta. E assim, acolitado por um travesti inglês-sim, que cada vez mais me convenço que o Blair não passa da Tatcher depois de submetida a uma intervenção de mudança de sexo- a fazer lembrar o cãozinho do His Master's Voice, e por um político espanhol de 4ª categoria a querer põr-se em bicos de pés para ter lugar na História, mas de quem já ninguém se lembra do nome, lançou-se nas 2ªs Cruzadas da História, esquecendo-se das infames marcas deixadas pelas 1ªs. Mas claro, também seria exagerado pretender-se que o brilhante texano conhecesse a História Mundial, que está para trás do séc.XX, e que exceda os limites do seu país.
Ah! pelo meio do atabalhoado do discurso, omiti a presença de um ilustre rapaz de sangue transmontano - pobres transmontanos, companheiros dos açoreanos no opróbio - que os recebeu na divisão mais longínqua da sua casa, e lhes serviu de mordomo naquela que seria a reunião da desvergonha.

Veja-se pois quem, vítima das decisões então, tão democraticamente tomadas, tem nos últimos dias ganho direito aos seus 15 minutos de fama em televisões, jornais e revistas:
- Uma quantidade considerável de americanos decapitados, lista que vai crescendo todos os dias.
- Dois jornalistas franceses, assassinados da mesma forma.
- Duas cooperantes italianas de quem ninguém sabe o paradeiro, mas que o mais certo é virem a integrar a tal lista.
- Um inglês que todos os dias sofre a agonia de não saber se aquele vai ser o primeiro dia do resto da sua vida, ou o último.

Estes são só exemplos, grãos na engrenagem que por ela vão sendo, inexoravelmente, esmagados.Já houve italianos, australianos, mais ingleses, turcos, todos imolados no fogo ateado pelo génio texano, um ser de tal gabarito que lhe poderia ser assacada a célebre frase: "O mundo estava à beira do abismo, comigo deu um passo em frente", se já não houvesse quem antes lhe reivindicasse a autoria.

É assim, portanto, um mundo estranho, este onde vivemos, onde se adquire uma fama que não se procura, nem se deseja. Por mim, espero continuar anónimo até ao fim. Oxalá continue a ser conhecido só na minha rua, afastado de cabeçalhos de jornais ou aberturas de Telejornais. Mesmo até ao fim.

Adenda - Soube agora pela Sic-Notícias que as duas italianas terão sido libertadas. Se assim foi, congratulo-me com o facto, e a notícia já fez o meu dia valer a pena.

P.S.- Claro que poderia aqui também falar daqueles dois seres que executaram sumariamente uma criança no Algarve. São talvez, por estes dias, os indivíduos mais famosos e mais citados no País.
Como se verifica, também pelos melhores motivos.
Aliás, a propósito deste triste episódio, tenho achado curiosa esta forma de alguns abordarem o caso que é o acrescentarem "E só por 12 euros". Como se isso pudesse sequer fazer parte da argumentação condenatória.
Não, importante é que a criança foi assassinada. E monstruoso que o tenha sido por quem a devia proteger. Os 12 euros podiam ser 12.000. A gravidade do caso, seria sempre a mesma.

Escrito por: VdeAlmeida, em 9/28/2004 05:56:00 da tarde | Permalink | |


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