Aos teus pequenos pés,
finos, delicados
poderia tecer um livro de poemas
todos eles muito elaborados
Procuraria em vários dicionários
minuciosamente
os termos adequados
para que tudo fosse
exacto e condizente
com essa especial beleza
que te está adjacente
Mas há atractivo,
de si tão esmagador
que nenhuma palavra chegará
para dar uma perspectiva adequada
por muito que o termo usado
se torne sedutor
E assim,
dispenso a eloquência
guardo para mim a emoção
e o desejo
que sinto de cada vez que os vejo
caminhar, de leve
sem quase tocar o chão
como se, invisível
uma pequena nuvem te transportasse
permanecendo assim em eterno êxtase
e escravo submetido voluntário
á tentação
Foto de Giovanni Gasttelli
Excertos do poema de Fernando Caldeira aos delicados pés da Condessa Guccioli:
Cismo, cismo e não sei inda
como tu, sendo tão linda
e tão vaidosa de o ser,
tens ai no chão pousados
os teus pezinhos coitados!
aí como uns pés quaisquer!...
...Olha! às vezes endoudeço
quando tos vejo, e apeteço
duas semanas... um mês...
dois meses... nem sei eu quanto,
ser um sapato, contanto
que tu me tragas nos pés!...
...Que hei-de eu fazer, quando os vejo,
a tanto faminto beijo
que tos quisera calçar?
que nem os peixes no rio
se juntam tanto a fio
na veia d’água a brincar?
...Olha, a dizer-te a verdade,
eu acho que é crueldade
deixá-los ir pelo chão...
Se queres, poupa-lhes passos,
levo-te a ti num dos braços
e eles ambos noutra mão.