Toda a gente a quem digo onde moro, me elogia a localização da casa, e se a conhecem in loco, então é que é. É a vista do Tejo, ali todo estendido aos pés da rua, é o facto de ser no centro de Lisboa, com acesso privilegiado a toda a cidade, é ser uma zona bem frequentada, e por aí fora.
Pois, vê-se logo que não me conhecem a vizinhança.
Foi precisamente sobre os vizinhos que hoje me decidi debruçar, e fazer um balanço sobre as relações que aqui tenho criado, mas nem pensem que vou falar da Elisa, que ela nos últimos tempos tem andado com umas saias e umas camisolas de malha tão justas que eu noutro dia, quando passei pelo lugar da fruta, ia desmaiando quando vi uma senhora sair com um par de meloas num saco de plástico, e passei a noite toda a ter pesadelos com aquelas frutas. Andei quase uma semana para me recuperar.
Aqui há tempos, comprei um tapete para pôr à porta, como toda a gente. Pois a vizinha de cima tem uma cadela que, não sei por que carga de água, habituou-se a vir ao tapete, agachar-se, e lá vai mijadela (por vezes com “acompanhamento”). Comecei a andar danado porque me fartei de limpar o tapete e as pessoas que cá vinham, mesmo assim queixavam-se que cheirava mal, e diziam que a minha casa cheirava a cão. Decidi comprar um tapete novinho em folha, e logo no primeiro dia tive “presente”. Foi aí que tive uma ideia brilhante: no dia a seguir, e com o tapete lavadinho, despejei-lhe um bom bocado de pimenta em cima. Claro que a cadela não falhou a visita, e eu a espreitar por uma pequena fresta da porta. Ela agachou-se e a pimenta cumpriu tão bem a sua missão que o animal já nem mijou, começou caím, caím, e saiu a roçar as partes baixas pelo chão. Em cheio, tinha descoberto a solução para os meus problemas.
No outro dia no café, lá estava a vizinha a comentar com um ar muito preocupado, que tinha que ir com a cadela ao veterinário, porque passava o tempo a roçar o cú pelo chão e a ganir. Eu até me meti na conversa e lhe disse que aquilo deviam ser lombrigas, pelo que ela devia ter cuidado com o que dava de comer ao animal, e ela respondeu que se calhar era isso.
Bem, mas isso já foi há um ano, e ontem tive que comprar um tapete novo, que o outro já estava gasto, e esta manhã cá estava assinalada a presença do raio do animal que pelos vistos tem memória curta. De modo que hoje, lá vou ter que espalhar pimenta no tapete.
Amanhã volto para contar o que se passou, e também da Etelvina que mora aqui em frente, ter apanhado o Machado, que é o marido, com o Artur, que é um trolha cabo-verdiano que trabalha numa obra na rua de cima e a quem os colegas de trabalho chamam “o Tripé”, na cama. Mas isso é mesmo só amanhã.
Nota - Espero que agora mudem a frase "Quanto mais uma pessoa se agacha, mais o rabo se lhe vê", para "Quanto mais um cão se agacha, mais o rabo lhe arde"