Por estes dias indecisos, nada me inspira nem comove. Nem sequer os juvenis canudos do cabelo em Angelica, o que me transmite uma sensação estranha de pairar acima das emoções humanas. Paradoxalmente, uma tal condição não me confere qualquer tipo de superioridade, o que também não me parece preocupante.
Assim, volto ao jardim onde me aguardam aquele aroma a citrinos e a estátua da mulher redonda com o filho ao colo, que me recorda sempre a talha da água fresca ao canto da cozinha, e sento-me debaixo de um castanheiro com os jacarandás ao fundo.
Bela cor, aquela. Ainda é a cor da cidade na Primavera em alguns locais, os que sobraram, uma cor de rosa afogueada, um roxo suave de alfazema, que me afirma que nada é perfeito, nem o criador, que se o fosse, ter-me-ia posto aquela cor nos olhos, não ma emprestaria só de tempos em tempos.
E é assim que perco tempo, a olhar em redor, por vezes nada vendo. Gosto de perder tempo. Só assim tenho a noção exacta de que o que tenho em mãos é a minha vida, um tempo que posso usar sem contar segundos e sem ter que prestar contas de tal. È uma imbecilidade ter sempre um propósito. Cada vez os tenho menos, o que confere maior relevância aos que tenho.
Perco-me, portanto, em inutilidades. Só me falta aprender a dançar.
Não há maior inutilidade que aprender a dançar. Que finalidade haverá em aprender a empurrar o outro em movimentos geométricos durante três minutos, acto que, em agravo, não nos deixa concentrar na música em fundo, da qual a cadência, se torna então, a única e fulcral vertente? Ah! mas é quase uma arte, afirmam-me.
Chegado aqui, vislumbra-se a luz, um novo e nobre propósito: aprenderei a dançar com o intuito único de perder tempo de uma forma onde aflora algo de artístico, e que definitivamente emprestará outra importância e colorido à minha enfática entrega às trivialidades.
Conforme com Giuseppe Tomaso di Lampedusa: “Mudemos alguma coisa par que tudo permaneça na mesma”
... e falaste de um dos meus filmes preferidos "IL Gattopardo". Adorei!