Olho agora o gato
que me dorme aqui,
Aos pés descansado
lustroso, mimado.
Deixa-me afagá-lo,
e dele tratar
mas ele comigo
parece-me alheio
e nem se importar
Afinal, eu sei bem,
nem sou o seu dono
É ele que me tem.
Para tanto lhe basta
aquele ronronar
Uma roçadela
na perna ao passar,
um olhar muito breve,
Uma piscadela
Que a mim me parece
mais doce afinal
E eis-me rendido
Escravo do bicho
Que se torna rei
E por toda a casa
Ele põe e dispõe
E é ele que faz lei
O gato
Com um lindo salto
Lesto e seguro
O gato passa
Do chão ao muro
Logo mudando
De opinião
Passa de novo
Do muro ao chão
E pega corre
Bem de mansinho
Atrás de um pobre
De um passarinho
Súbito, pára
Como assombrado
Depois dispara
Pula de lado
E quando tudo
Se lhe fatiga
Toma o seu banho
Passando a língua
Pela barriga.
(Vinicius de Moraes)